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Política

Bolsonaro cede e sanciona lei que inclui levantamento sobre autismo no Censo 2020

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BRASÍLIA – O presidente JairBolsonaro sancionou nesta quinta-feira (18) uma lei que inclui no Censo 2020 levantamento de dados sobre a população autista do Brasil.

“Atendendo à necessidade da comunidade autista no Brasil e reconhecendo a importância do tema, sancionamos hoje a Lei 13.861/2019 que inclui dados específicos sobre autismo no Censo do IBGE. Uma boa tarde a todos!”, escreveu Bolsonaro em suas redes sociais.

— O senhor está representando milhares e milhares de famílias que estavam se sentindo completamente no escuro, invisíveis, e isso é um grande passo para toda a comunidade autista, um passo gigante para todas as famílias que batalham há anos — afirmou Mion. — Eu tenho a honra de estar aqui representando o trabalho de todas essas instituições que há décadas lutam por um reconhecimento como esse.

Bolsonaro parabenizou o apresentador e afirmou que a medida era “um primeiro passo”.

— Algumas divergências nós sempre vamos ter, mas, como norte, é um primeiro passo. Haverá outras pesquisas, outras formas de reconhecer, por parte do poder público, essas pessoas. Em havendo condições, faremos de tudo para atendê-los.

Mais cedo, o presidente havia demonstrado irritação ao conversar com um grupo de pais acompanhados de filhos com autismo , que protestava na frente do Palácio da Alvorada justamente pela inclusão de uma pergunta sobre a incidência de pessoas com o transtorno em famílias brasileiras no Censo de 2020.

Os manifestantes gritavam repetidamente “autistas no Censo” quando o presidente deixou o carro, perto do portão principal da residência oficial para conversar com eles. Diretamente cobrado por um dos presentes, Bolsonaro avisou:

— Pessoal, olha, atenção: se daqui pra frente for para fazer protesto, não vou parar mais (no local). Eu quero atender todo mundo. O Estado tem o dever de atender quem necessita, mas dessa forma… — disse o presidente, diante de cerca de 15 pessoas, cercado de seguranças.

Dia Mundial do Autismo: demora no diagnóstico ainda é uma das principais barreiras

Os movimentos de defesa de crianças com autismo destacam que o Brasil não detém nenhum estudo próprio sobre a incidência de casos no país, o que dificulta qualquer tipo de política pública voltada os portadores da deficiência.

O objetivo é saber quantos autistas existem no Brasil, já que hoje não existe dado oficial. Estatísticas americanas e europeias apontam que, para cada 68 crianças nascidas, uma tem espectro autista (TEA – Transtorno do Espectro Autista). Estima-se que, no Brasil, já existam mais de 2 milhões de autistas.

— Pedimos pela inclusão de uma pergunta sobre o autismo no Censo porque queremos saber quantas pessoas com espectro autista temos no Brasil. Isto é fundamental para conseguirmos políticas públicas para diagnóstico e tratamento dessas pessoas. Quanto mais cedo o tratamento começar, mais independentes essas pessoas serão — argumenta Viviani Guimarães, vice-presidente do Movimento Orgulho Autista Brasil (MOAB), que esteve presente na manifestação em frente ao Alvorada. — O Censo só vai registrar os casos já diagnosticados. Sabemos que, provavelmente, teremos mais relatos de pessoas autistas no sul e sudeste, porque nestas regiões o acesso ao diagnóstico é melhor do que no norte e nordeste. Mas assim, onde a incidência for menor que a média mundial, vamos pedir pela capacitação de médicos e professores, por exemplo, para perceber os sintomas e antecipar o diagnóstico.

Depois de conversar com os manifestantes, Bolsonaro explicou aos jornalistas sua visão sobre o imbróglio.

— Não tem problema nenhum botar no Censo. Eu perguntei para eles, porque ninguém sabe: quantos autistas aproximadamente temos no Brasil? Dois milhões. Se você quiser botar no BPC [Benefício de Prestação Continuada], vão ser R$ 2 bilhões por mês, serão R$ 24 bilhões por ano. Nós queremos atender — disse o presidente.

As declarações foram comemoradas pelos manifestantes, que o ouviam. Em seguida, no entanto, ele passou a fazer ponderações sobre a confiabilidade da pesquisa.

— Agora a pessoa que vai fazer o Censo, qual é o preparo dela para dizer se esta é autista ou não? Vai acreditar ou não no pai? Confio em todo mundo, pelo amor de Deus, mas, a partir do momento que se vislumbra essa possibilidade, vai ter gente que vai responder que sim. Com todo o respeito que tenho aos autistas do Brasil, por favor. É igual ao seguro-defeso, dois terços é fraude. Você tem que ter um critério que não é apenas o recenseador — defendeu.

Argumentando que não se trata de uma situação simples, Bolsonaro previu que depois do Censo virá a “pressão para mais um benefício”. Ele disse não ser contra, caso haja recursos disponíveis.

— Então, o que a gente quer? É fazer a coisa bem feita. Se é para sancionar, eu não vejo maldade. Eu vou seguir a minha equipe, eu não trabalho sozinho. Quais os prós e contras, sancionando ou vetando? Agora, vamos supor que eu vete, vai todo mundo dar pancada em mim — complementou.

— Quem paga a conta no final, qual o grau do autismo para ver se merece um BPC no futuro? Fazer demagogia eu faço. Quer fazer igual o PT fazia? Então dá para todo mundo — acrescentou.

Nesse momento, uma mulher gritou que todas as deficiências estão contempladas no Censo, menos a dos autistas e disse contar com o governo. O presidente voltou a se irritar:

— Não vou parar mais aqui enquanto tiver protesto, não vou parar. Porque, se eu estou discutindo o assunto com fundamento, com razão, o pessoal quer impor uma questão. Eu sanciono sem problema, nenhum — disse, recebendo palmas.

Bolsonaro então negou que estivesse fazendo essa promessa e disse que com R$ 24 bilhões a mais anualmente teria que aumentar a carga tributária.

— Tá bom? Ta resolvido o assunto? – concluiu.

IBGE era contrário à inclusão no Censo

A decisão de Bolsonaro de sancionar a lei representa uma mudança de posição do presidente e contrasta não apenas com a análise técnica do IBGE sobre o tema, mas com a decisão, anunciada em abril, de reduzir o número de perguntas do próximo Censo de 112 para 76, visando a redução dos gastos com a pesquisa.

Na última sexta-feira (12), o presidente compartilhou um vídeo com explicações da presidente do IBGE, Susana Cordeiro Guerra, sobre o assunto e escreveu que o Censo carece de critérios específicos em relação ao autismo.

Segundo o presidente, isso inviabilizaria um levantamento adequado, mas existia uma “proposta mais precisa, técnica e que trará resultados dois anos antes, agilizando o desenvolvimento de políticas públicas eficientes”.

Questionado sobre a inclusão do levantamento sobre autismo no Censo, o IBGE afirmou, por meio de nota, que “cumprirá a lei e trabalhará para que as informações sejam captadas da forma mais fidedigna possível, garantindo a qualidade e cronograma da operação do Censo 2020 já em curso”.

A vice-presidente do MOAB Viviani Guimarães explica porque as associações que lutam pelas pessoas com autismo preferem o Censo à Pnad.

— A Pnad vai nos auxiliar muito num momento pós-censo, pois ela é uma pesquisa qualitativa e poderá nos dizer quantos autistas severos temos, quantos deles fazem tratamento. Ela vai nos trazer um filtro mais refinado sobre a situação dos autistas nas metrópoles. Mas, neste momento, precisamos levantar quantos são para criarmos políticas públicas  — diz Viviani Guimarães.
Por Gustavo Maia do O globo
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